Senadores de oposição apresentaram nesta terça-feira (26) uma proposta para que um plebiscito — consulta à população por meio do voto — sobre aborto seja feito no Brasil. O plebiscito, porém, só será realizado se os plenários da Câmara e do Senado aprovarem o pedido.
Na sexta-feira (22), o Supremo Tribunal Federal (STF) começou a julgar uma ação que tenta descriminalizar o aborto feito por mulheres com até 12 semanas de gestação. A única ministra a votar até agora, a presidente da corte, Rosa Weber, foi a favor.
Os parlamentares propõem que o eleitor responda “sim” ou “não” à pergunta “Você é a favor da legalização do crime de aborto?”.
O líder da oposição no Senado, Rogério Marinho (PL-RN), avalia que, se o Congresso não debater o tema, estará “dando poder” ao STF.
Atualmente, o Código Penal pune, com até três anos de detenção, a gestante que opta pelo aborto. Para quem realiza o procedimento na gestante, com consentimento dela, a pena é de um a quatro anos de reclusão, o que admite início do cumprimento em regime fechado.
O aborto voluntário é crime, independente do tempo de gestação. As exceções são quando a mãe corre risco de morte, em caso de estupro e anencefalia do feto.
A oposição argumenta, no pedido de plebiscito, que respeita a regra atual. “Logicamente, por defendermos o Estado de Direito, respeitamos as hipóteses previstas no Código Penal que excepcionam o crime, quais sejam, quando a mãe corre risco de morte e em caso de estupro”, diz a proposta apresentada por Rogério Marinho.
Para Jolúzia Batista, representante do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea), a pergunta sugerida pelos parlamentares para o plebiscito é “tendenciosa” e o pedido de consulta popular “uma reação tácita muito nítida à tramitação da ação no STF e voto positivo da Rosa Weber”.
“No Brasil, recrudesce gravidez infantil, estou falando de meninas de 10 anos de idade, grávidas em situação de violação sexual dentro de seus lares. É sobre isso que devemos falar, sobre o alto índice de mortalidade materna entre mulheres negras, de periferias que não têm acesso a método anticoncepcional e, portanto, recorrem a procedimentos clandestinos. Sem contar toda a negação de planejamento familiar. Esse debate é muito mais amplo e diz respeito ao acesso à saúde, a planejamento reprodutivo. É sobre isso que o plebiscito devia tratar e não partir de uma pergunta altamente criminalizadora”, avaliou Jolúzia.
Reação ao STF
A ala conservadora do Senado tem reagido contra julgamentos em curso no tribunal. Apesar de o STF ter julgado inconstitucional a tese de um marco temporal para demarcação de terras indígenas no Brasil, o relator do tema na Casa, Marcos Rogério (PL-RO), confirmou que o projeto será votado nesta quarta-feira (27) na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). O texto prevê que os povos indígenas só terão direito à demarcação de terras que já eram tradicionalmente ocupadas por eles no dia da promulgação da Constituição, 5 de outubro de 1988.
Outro assunto discutido na Casa diz respeito às drogas, já que o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), apresentou proposta para mudar a Constituição e incluir no texto que a posse e o porte de qualquer droga serão considerados crimes. O placar no STF está cinco a um para que o porte de maconha, em pequena quantidade e para uso pessoal, deixe de ser crime. Um pedido de vista (mais tempo para análise do caso) foi apresentado pelo ministro André Mendonça no fim de agosto, o que interrompeu o julgamento.
Um exemplo de consulta pública já realizada no Brasil foi o referendo sobre o Estatuto do Desarmamento, que ocorreu em outubro de 2005. Na ocasião, a população votou contra artigo da lei que proibia o comércio de armas de fogo e munição no país.
No caso do referendo, a população é chamada a dar opinião sobre uma lei já em vigor, enquanto, no caso do plebiscito, a consulta à população é sobre uma possibilidade futura, que ainda não virou regra.
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