O Ministério do Planejamento anunciou nesta quarta-feira a necessidade de um novo bloqueio nas chamadas despesas discricionárias (não obrigatórias, ou seja, investimentos e custeio). A trava foi de R$ 1,1 bilhão e, no acumulado do ano, já são R$ 5 bilhões que precisaram ser bloqueados.
Também foi divulgada projeção para o déficit para as contas públicas deste ano, que saiu de R$ 141,4 bilhões (1,3% do PIB) para R$ 177,4 bilhões (1,7% do PIB). Os números constam no quinto relatório bimestral de avaliação de receitas e despesas.
O resultado primário trata do balanço de despesas e receitas — sem considerar os gastos com os juros da dívida pública. Déficit é despesa acima da receita, e superávit é o contrário.
Já despesas discricionárias são verbas que não são obrigatórias, mas servem para o custeio da máquina pública e investimentos. Será o quarto bloqueio seguido no governo Lula.
- A Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) autoriza um rombo de até R$ 213,6 bilhões, o que corresponde a 2% do PIB. Até agora, os números não indicam um descumprimento formal da regra;
- Porém, o valor está bem acima do previsto inicialmente pelo governo. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já havia mencionado que as contas teriam déficit de R$ 100 bilhões em 2023 – algo em torno de 1% do Produto Interno Bruto (PIB).
Teto de gastos
Esses bloqueios são decorrentes do aumento de despesas acima do limite estabelecido pelo teto de gastos, que travou as despesas federais à inflação do ano anterior. Na prática, todo o valor que passa do limite do teto precisa ser bloqueado.
Apesar da nova regra fiscal já ter sido aprovada e sancionada, neste ano, as despesas primárias (obrigatórias e discricionárias) ainda estão vinculadas à limitação da antiga regra. Isso acontece pelo chamado princípio da anualidade no orçamento. A nova regra fiscal foi aprovada no meio do ano.
A atual sistemática de limitação de gastos será totalmente substituída pelo arcabouço fiscal a partir de 2024.
Despesa aumentou
As despesas primárias registraram aumento total de R$ 21,9 bilhões no quinto bimestre do ano, em relação ao quarto bimestre.
Desse total, R$ 16,3 bilhões foram para compensar a perda de arrecadação de estados, Distrito Federal e municípios.
A redução da receita foi provocada pela Lei Complementar 194, de 2022, do governo Bolsonaro, que limitou a 17% ou 18% a alíquota do ICMS cobrada sobre combustíveis.
Além disso, houve aumento de R$ 4,3 bilhões no orçamento da saúde.
Receita menor
Enquanto as despesas aumentaram, as receitas do governo diminuíram no período. No período, foram R$ 9,0 bilhões de queda da arrecadação, considerando conjuntamente o Imposto de Importação (II), o Imposto de Renda (IRPJ, Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL).
Além disso, o governo deixou de contar, em 2023, com R$ 12,6 bilhões em repasses de depósitos judiciais na Caixa Econômica Federal.
Esses são valores são referentes a tributos e contribuições federais administrados pela Receita, que devem ser efetuados na Caixa. O banco tem de repassar à Conta Única do Tesouro.
Previsão da Fazenda
O Ministério da Fazenda está prevendo, contudo, um déficit primário próximo de R$ 145 bilhões ou 1,3% do PIB para o ano de 2023. Isso porque há recursos que estão autorizados para gastos, mas não efetivados. São as chamadas verbas “empoçadas”. A previsão foi dada pelo secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, em coletiva nesta tarde.
— Hoje nós estamos se aproximando de R$ 35 bilhões em empoçamento de recursos (o último dado estava em R$ 28 bi), então, é muito difícil, na nossa estimativa, ficar abaixo de R$ 30 bilhões (até o fim do ano). E provavelmente estamos falando de um déficit primário de para algo em torno de R$ 140 bilhões a 145 bilhões (no fechamento do ano) — declarou.
Áreas atingidas até agora
Um levantamento da Associação Contas Abertas mostra que os bloqueios até agora atingiram verbas para assistência hospitalar, auxílio gás, recursos para a habitação de interesse social, a distribuição de livros e materiais didáticos.
Na lista também há travas nos recursos para apoio ao desenvolvimento da Educação Básica e ao programa Bolsa Verde, de apoio à Conservação Ambiental.
‘Divergência técnica’ com o BC
Pelos dados do Banco Central, o rombo do quinto bimestre chegou a R$ 203,4 bilhões ou 1,9% do PIB. A diferença em relação aos dados do Tesouro está no montante de R$ 26 bilhões, referentes ao resgate de valores “abandonados” nas contas do Fundo PIS/Pasep.
Um artigo na proposta de emenda à Constituição (PEC) da Transição, aprovada no fim de 2022, autorizou o governo Lula a utilizar o “dinheiro esquecido” por trabalhadores nas cotas do PIS/Pasep.
Diferente do BC, a equipe econômica do governo considera, em sua metodologia, esse valor como receita primária. Na coletiva de hoje, Rogério Ceron falou em “divergência técnica” com a autarquia monetária.
— O Tesouro tem uma relação institucional muito boa com o Banco Central, mas temos uma divergência técnica em relação a esse ponto. Esses valores foram registrados como receita primária, como devem ser, e o Banco Central não considera assim. Não tem efeito prático (divergência), porque a meta primária não está apertada — disse
O Globo