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• No Dia das Mães, mulher celebra início da faculdade de medicina ao lado da filha: ‘Nunca é tarde’

O relógio marca 5h quando a primeira luz se acende na casa da família Vieira, no bairro Santa Lúcia, região Centro-Sul de Belo Horizonte. Na cozinha, Julianne Vieira Júlio, de 48 anos, mãe de três filhos, prepara o café enquanto revisa mentalmente os aprendizados do dia anterior. Ao lado dela, Ana Clara Vieira Cecílio, de 19 anos — a primogênita — organiza o material da aula e revisa com a mãe o ciclo de Krebs, um processo que transforma os alimentos em energia para o corpo funcionar. Ambas começaram neste ano o curso de medicina e vão celebrar, neste domingo (11 de maio), o primeiro Dia das Mães dividindo mais que a casa: agora, compartilham também a vida acadêmica.

Mãe e filha estudam no Centro Universitário de Belo Horizonte (UniBH). Mas essa não é a primeira vez de Julianne na faculdade. Em 2002, ela se formou em psicologia. Durante a carreira, acumulou pós-graduações em saúde mental, segurança do trabalho e ergonomia. Ela também é dona de uma empresa na área de medicina do trabalho. “Sempre gostei de estudar, mas a medicina parecia um sonho distante, coisa para uma próxima encarnação. Com 48 anos, você acha que está tarde demais. Mas nunca é tarde demais. Eu percebi que quem coloca limites somos nós mesmos”, afirma.

Ela diz que a vontade estava guardada há muito tempo, mas a decisão veio após um período de estagnação profissional. “Era uma vontade escondida, que eu achava que nunca iria realizar. Já tinha conquistado muito profissionalmente, mas sentia que precisava de um novo desafio. A medicina apareceu como possibilidade e eu abracei.”

 

Foto: Alex de Jesus / O TEMPO

Incentivo familiar

A virada de chave veio com incentivo da própria filha. “Minha mãe, inicialmente, pensava em fazer arquitetura como segunda graduação, mas eu disse: ‘Mãe, você quer medicina. Então faz medicina’. Ela se inscreveu no processo seletivo, ficou com a expectativa em silêncio e só contou depois”, lembra Ana Clara.

A jovem conseguiu ingressar na faculdade por meio da nota do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Atualmente, mãe e filha estão no mesmo período da graduação, mas em subturmas diferentes. Apesar disso, compartilham as mesmas disciplinas e conseguem estudar juntas. “Está sendo uma experiência que eu nunca imaginei viver, e que poucas pessoas têm. A gente conversa sobre as matérias no carro, estuda para os testes, troca dúvidas. Está sendo muito especial”, relata Ana Clara.

(Foto: Alex de Jesus / O TEMPO)

Julianne divide a rotina entre os estudos, a administração da empresa, a maternidade e os cuidados com a casa. Além de Ana Clara, ela é mãe de Lucas, de 17 anos, e Ísis, de 10. Dorme, em média, por volta das 23h e acorda às 5h30. “Tenho muitos compromissos, mas a energia vem de dentro. Fazer medicina me deu ânimo, me sinto mais viva, mais feliz. Estou realizando um sonho.”

Para o futuro, Ana pensa em se especializar em cirurgia cardiovascular ou neurologia. “Tenho muito interesse em entender como o cérebro funciona. É uma área que ainda tem muito a ser descoberto e quero pesquisar sobre isso.” Já Julianne considera seguir na medicina do trabalho, área que já domina, ou mergulhar na psiquiatria, unindo a nova formação com os conhecimentos em psicologia.

Neste Dia das Mães, a família celebra mais do que flores ou presentes: comemora a coragem de recomeçar e a força dos laços que unem gerações pelo conhecimento. “O sonho existe para ser sonhado. E vivido”, resume Julianne.

Tradição de família

Em outra ponta da Grande BH, a medicina também se entrelaça com os laços familiares — e atravessa gerações. Juliana Reis Guimarães, de 42 anos, cresceu vendo os pais atuarem na profissão. Hoje, ela não apenas seguiu os mesmos passos como também trabalha ao lado deles, do marido e da cunhada, todos na mesma especialidade: oftalmologia.

“Meus pais nunca me forçaram. Mas ver os dois fazendo o que amam com tanto entusiasmo despertou em mim o mesmo desejo. Acho que fui pega pela genética”, diz Juliana, que é filha dos médicos Marcia Reis Guimarães, de 70 anos, e Ricardo Queiroz Guimarães, de 72 — fundadores do Hospital de Olhos Dr. Ricardo Guimarães, na Vila da Serra, em Nova Lima.

Marcia e Ricardo se conheceram ainda na faculdade, em uma partida de tênis. Casaram-se, foram morar no exterior — viveram na França, Alemanha, Inglaterra e Estados Unidos — e voltaram ao Brasil após o fim da ditadura militar. “Criaram quatro filhos com uma rotina intensa, conciliando a medicina e a docência com a maternidade.”

Juliana seguiu não só a profissão, mas também a especialidade dos pais. Além de atender pacientes, ela também dá aulas, participa de congressos e treina novos oftalmologistas. “A tradição familiar é forte, mas mais do que seguir os passos, eu encontrei o meu próprio caminho. Nunca foi imposição. Foi um exemplo tão bonito que me deu vontade de continuar.”

Casados há mais de 20 anos, Juliana e o marido têm três filhos: de 8, 6 e 1 ano. Hoje, ela vê a maternidade com um novo olhar. “Quando a gente vira mãe, passa a enxergar a nossa própria mãe de outro jeito. Eu estou onde estou porque tive a sabedoria de seguir a trilha dela. Não foi um sonho solto: foi uma trajetória inspirada. E isso fez tudo ser mais leve.”

O Tempo

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